Assegurando a Educação em tempos de COVID-19: O caso do projecto NORAD

Friday 18 December 2020

Desde Maio de 2020, o Projecto NORAD da Save the Children, que está a ser implementado em parceria com o Governo Provincial de Manica, tem se concentrado no apoio à uma estratégia de ensino baseado na família para evitar que alunos em áreas muito remotas abandonem as escolas devido a COVID- 19 devido as medidas de prevenção, que forçaram o encerraram de todas as instituições de ensino do país em Março de 2020. Para esta iniciativa, foram formados 436 professores ambulantes e 520 promotores de leitura comunitários para apoiar 50,142 alunos do ensino básico nos distritos de Macossa, Tambara, Machaze e Manica.

O encerramento das escolas em Março interrompeu gravemente a educação das crianças em todo o país, mas a situação é mais grave nas áreas remotas. Embora o governo tenha dado aulas através da Internet e canais públicos de televisão e rádio, e através da distribuição de folhas de exercícios que os pais e responsáveis recolhem nas escolas, a realidade é que em algumas das áreas remotas da província de Manica, estas opções não são viáveis para os alunos. Não só faltam recursos a nível distrital para imprimir as fichas de exercícios dos alunos, como a maioria das famílias não tem rádio ou televisão, sem falar no facto de muitas comunidades não estarem ligadas à rede eléctrica. O distrito de Macossa, por exemplo, não possui uma rádio comunitária, o que torna extremamente difícil para os alunos continuarem a estudar.

Para minimizar a situação, o projecto NORAD da Save the Children, em parceria com o Governo, procurou uma alternativa para os 50,142 alunos dos quatro distritos-alvo do projecto, nomeadamente Macossa, Sussundenga, Machaze e Manica. A solução foi estabelecer um sistema de professores ambulantes que teriam a responsabilidade de reproduzir, na medida do possível, fichas de exercícios manuscritas ou digitalizadas. Além disso, um grupo de 520 promotores comunitários foi acionado com a responsabilidade de recolher essas fichas de exercícios nas escolas e entregá-las aos alunos em suas respectivas casas, explicando o seu conteúdo e respondendo a dúvidas. No dia seguinte, o promotor recolhe os exercícios e leva às escolas para que os professores façam a coreccção.

“A sociedade deve salvaguardar os direitos da criança e a educação é fundamental; tanto que é um dos nossos objetivos estratégicos. Um grande desafio que enfrentamos é garantir que mais raparigas tenham acesso à educação - quero dizer, educação de qualidade. Para isso, precisamos do apoio e do empenho das famílias”, afirma Ana Dulce Guizado, Gestora Provincial do Programa de Manica.

 MACOSSA E MACHAZE COMO DISTRITOS-MODELO

Macossa e Machaze são considerados distritos-modelo para a implementação da estratégia de ensino familiar, pois foi através desta estratégia que os Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia (SDEJT) do Distrito de Macossa resgataram um pouco mais de 50 alunos ora enviados para trabalhar nos campos agrícolas locais.

O Chefe do Departamento de Educação Geral da SDEJT em Macossa, Manuel Fundisse, está satisfeito com a estratégia de ensino centrada na família implementada pela Save the Children e diz:

“No nosso distrito não temos uma rádio comunitária onde as crianças possam aprender, como acontece em outros distritos. Reconhecendo estas dificuldades, acolhemos com agrado esta estratégia de ensino baseada na família e está a surtir os efeitos esperados”.

Chefe do Departamento Geral de Educação da SDEJT- Macossa, Manuel Fundisse

O Director dos SDEJT em Machaze, Juvêncio Fulede, acredita que a educação familiar é uma mais-valia para o sistema de ensino em geral e é de opinião que mesmo depois de retomar as aulas normais a estratégia deve continuar.

 

“Tivemos muitas dificuldades no início da implementação do decreto, mas assim que iniciamos o modelo baseado nas famílias, percebemos que as crianças que passaram para a 3ª classe já sabiam ler palavras, frases simples e fazer contas. As crianças não saem de casa à vontade; passaram a ter uma ocupação específica e controlada por meio do promotor de leitura, o que é um grande ganho. Sentimos que os pais e responsáveis estão muito engajados”, disse Juvêncio Fulede.

Director da SDEJT- Machaze, Juvêncio Fulede

O QUE DIZEM OS BENEFICIÁRIOS?

Na comunidade de Nhamagua no distrito de Macossa, tivemos a oportunidade de conhecer uma menina de 10 anos chamada Serena João. Serena frequenta a 4ª classe e afirma ter recebido os exercícios por meio de promotores de leitura, aos quais também faz perguntas sobre alguns assuntos.

“Gosto dos exercícios; a professora deve continuar a trazer eles aqui para minha casa porque gosto de estudar. Quando eu crescer quero ser carpinteira para fazer portas aqui na minha aldeia”, disse.

 

Os pais e encarregados de educação no distrito de Macossa e Machaze acolhem bem a estratégia, pois permite e impulsiona o ensino e a aprendizagem dos seus filhos. Edmo Sianhalo, pai de Serena João, diz que a filha melhora cada vez mais o trabalho escolar.

 

Serena João, aluna da 3.ª classe, ao lado do seu promotor de leitura, Henriques Gopane, em Nhamagua.

Serena João, entre o irmão mais novo e os pais

“Antes da introdução deste sistema, era difícil para as crianças se concentrarem em seus estudos; tudo o que queriam era estar nas ruas brincando. Quando os promotores começaram a trazer os exercícios, ficamos aliviados porque era realmente na hora certa. Tenho monitorado a actuação dela e ajudado os promotores no trabalho”, disse Edmo Sianhalo.

Dunda, no distrito de Macossa, é outra comunidade onde o projecto NORAD está a implementar o sistema de educação familiar. Aqui são atendidos mais de mil alunos da Escola Primária de Dunda, tarefa realizada por três professores ambulantes.

Joaquim Serrote frequenta a 6º classe e diz:

 

“Normalmente recebo exercícios para resolver no meu caderno e às vezes leio um livro para me ajudar a resolver os exercícios que o professor Inácio Raisse traz semanalmente”

Joaquim Serrote, aluno da 6ª classe na EP Dunda, em Macossa

Elisa Marizane é avó de Joaquim Serrote. Acompanha de perto o esforço do neto e diz que “a iniciativa é bem-vinda porque incentiva o ensino, algo que o meu filho (o pai do Joaquim) não teve oportunidade de usufruir bem. A escola está indo bem para meus netos e é boa porque enquanto eles estão aqui em casa também estão prevenidos contra o coronavírus. Eu quero que eles sejam médicos”.

Em Machaze, Zacarias Timóteo, um menino de nove anos que estuda na 3ª classe da Escola Primária Save, diz que “é bom” estudar em casa, apesar de sentir falta de brincar com os amigos da escola. Gosta de ler e sonha em ser um professor quando ele crescer.

“Também gosto de estudar na escola e de brincar com os meus amigos, mas aqui em casa, quando chega a minha promotora, gosto de estudar com ela também. Quero ser professor quando crescer”, disse Zacarias

Também em Machaze, na comunidade de Macu, o pequeno Moisés Mussá, de nove anos, normalmente estaria a estudar na escola local. Ele afirma que sente falta do amigo e colega Elias, que não o vê desde o encerramento das escolas.

 

“Queria voltar à escola para ver o meu amigo Elias. Quando eu voltar para a escola quero muito estudar para ser professor, porque os professores recebem dinheiro e com esse dinheiro poderei ajudar os meus pais”, disse Moisés.

A Coordenadora Provincial de Comunicação e Advocacia da Save the Children em Manica, Flávia Gumende, em conversa com Elisa Marizane, avó de Joaquim Serrote